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quinta-feira, 28 de julho de 2011

Vale a pena " Ler de novo " .


Edição 20 - 5/2011

Entenda o seu público
Programas que obtêm maior sucesso são aqueles que se adaptam à realidade local
O Ciber Letras de Olinda, usa e-mails para incentivar a escrita
Experiências de ensino para jovens e adultos que aderem à concepção da educação continuada ao longo da vida, com formatos experimentais abertos às condições de vida dos estudantes, tornam-se casos de sucesso nessa modalidade de ensino. A teoria, que pode parecer distante, lança as bases para diversificadas situações práticas, adaptáveis às diferentes realidades regionais brasileiras.

O Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos (Cieja) Campo Limpo, em São Paulo, conseguiu se estabelecer como espaço aberto à comunidade, em um bairro com alto índice de violência urbana. "Os moradores fizeram a apropriação do equipamento público. Para isso, tive de mostrar respeito a suas características, presença ativa e sensível às necessidades, atendimento na secretaria durante todo o dia. Hoje, temos sala de informática e biblioteca para uso de qualquer pessoa", afirma a diretora da instituição, Eda Luiz.

Segundo ela, o projeto diferenciado baseia-se no respeito ao sujeito, na linha da concepção de escola democrática. "Fazemos mapeamento do entorno, trazemos para a escola as demandas da comunidade. Usamos muito o legado de Paulo Freire." Para chegar a esta população, o Cieja Campo Limpo também tem parceria com ONGs que atuam na região e outros entes públicos, como o Centro de Educação Unificada (CEU) Campo Limpo.

A relação com as ONGs mostra verdadeira articulação e busca de aproximação com a comunidade. "Antes, elas condicionavam o recebimento dos benefícios à matrícula na escola ou no EJA. Conseguimos negociar e, atualmente, muitas exigem que os adolescentes passem por aqui apenas para uma conversa, como condição para participar de suas atividades", explica Eda.

A ideia é que o diálogo substitua a obrigação. "É possível fazer com que o aluno seja cativado pelo benefício que a educação vai proporcionar à sua vida. Procuramos escutá-lo e mostrar a necessidade do ensino para ele, sem aquele discurso de um futuro distante e um emprego regular, porque a realidade das pessoas que vivem na periferia não é essa. Mas o conhecimento pode ajudá-lo nas decisões simples do cotidiano, para se posicionar quanto ao consumo, à moda, à mídia", pondera a diretora.

A ampliação do atendimento a diversas esferas da vida é outro ponto abordado pelo Cieja Campo Limpo. "Temos médicos de postos de saúde próximos que vêm dar palestras sobre temas como sexualidade, pois existe a gravidez na adolescência no entorno." Oficinas de grafite e a montagem de uma rádio comunitária fazem parte da busca por estender as atividades do centro para o campo cultural. São iniciativas muito particulares, que se devem ao empenho pessoal e profissional da liderança da instituição, mas que se inserem na lógica de articulação intersetorial defendida por especialistas.

Percurso formativo
A organização dos tempos de estudos e a formatação do currículo no Cieja Campo Limpo também seguem caminhos próprios. "São seis períodos de aulas, com funcionamento nos três turnos - manhã, tarde e noite. Os grupos são formados por área de conhecimento, com aulas de 2h30 de duração", explica Eda. Outro diferencial é o período de matrícula, que na instituição dura todo o ano. "Existe evasão por mobilidade na região, por mudança de moradia", comenta. Foram estratégias para ampliar o atendimento, concebidas com o cuidado de que se enquadrassem às exigências legais.

A rede municipal de São Paulo, na qual está inserido o Cieja Campo Limpo com 1.390 alunos, oferece educação de jovens e adultos de diferentes formas: ensino fundamental no período noturno, em parcerias com entidades sociais pelo programa Movimento de Alfabetização (Mova), Ciejas e dois Centros Municipais de Capacitação Profissional (CMTC). O quanto esses modelos estão articulados é pergunta em aberto. "O que vemos é que no modelo de Cieja não faltam alunos. Mas existem públicos para vários tipos de ofertas. Por exemplo, no Cieja Butantã (outro bairro de São Paulo), em um prédio pequeno, há 800 alunos. Na mesma região, o CEU Butantã, com toda aquela infraestrutura, possui muito poucos estudantes", observa Maria Clara Di Pierro, da Faculdade de Educação da USP.

Reconhecimento do desafio
Em Olinda (PE), a Secretaria de Educação Municipal tem buscado parcerias com instituições das esferas municipal, estadual e não governamental, em programas e projetos para os públicos jovem, adulto e idoso, com ênfase na alfabetização. As ações de impacto na luta contra o analfabetismo são citadas entre as prioridades das políticas públicas desde 2001, para combater o índice de 9,9% de pessoas que não sabem ler e escrever entre sua população (dados do Censo do IBGE 2000).

Segundo Jaciara França, coordenadora da Divisão de EJA da secretaria de Olinda (PE), o programa Brasil Alfabetizado (desde 2003) e a iniciativa Brigada Paulo Freire atenderam 23 mil pessoas, ou 80% dos analfabetos. Para este ano, a meta do Brasil Alfabetizado é atingir 4 mil analfabetos. "Com essas iniciativas e a expansão de turmas, observamos que a procura por EJA, ultimamente, tem sido pelas séries finais", afirma.

Uma das iniciativas recentes alia alfabetização e inclusão digital. Jaciara conta que o programa Ciber Letras, aplicado nas escolas municipais que oferecem EJA, incentiva a leitura e escrita por meio da troca de mensagens eletrônicas entre alunos das turmas.

Iniciado em meados de 2010, o programa teve adesão suficiente para que já haja planos de expandi-lo em 2011. "Observamos regularidade no uso do laboratório de informática no turno da noite, mudança na prática dos docentes no que se refere ao uso dos computadores e na comunicação on-line e o desenvolvimento da escrita e da leitura em situações reais de uso", relata Jaciara. Estímulo à aprendizagem colaborativa e estudantes interessados no domínio da tecnologia e com motivação para ir à escola também estão entre os ganhos.

Os resultados para valer, em sua opinião, serão mostrados pelo Censo 2010 (ainda não publicado), mas ela reconhece o movimento contínuo em EJA. "Diante do cenário nacional apresentado na última Pnad, acreditamos que o desafio permanece, considerando inclusive que, além da demanda residual aferida em 2000, há muitos estudantes que estão no sistema regular, completaram 15 anos e ainda não se alfabetizaram."

O próximo passo
A integração de EJA com o mundo do trabalho persiste como desafio. Mesmo experiências de sucesso como a do Cieja Campo Limpo de São Paulo encontram limites para suas ações, ainda que sejam pensadas em termos da oferta de um itinerário formativo para alunos e docentes.

Para Maria Clara Di Pierro, da Feusp, a EJA profissionalizante depende de estruturas sólidas e custosas, como oficinas, equipamentos e professores, iguais às das escolas técnicas. O Proeja, que visa fazer a ponte entre as duas modalidades de ensino, tem curto alcance, com pouco mais de 20 mil matrículas em 2009, segundo o Censo Escolar. "Há experiências de programas contextualizados para grupos socioculturais específicos, como quilombolas, indígenas e pescadores, que podem ser computados como avanços", pontua Maria Clara. (LS)

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